Desde 24 de Junho de 2003

Críticos de Cinema (part un)

São várias as ocasiões em que sou violentamente molestado por jovens cinéfilos de sangue quente que tendem a levar os pequenos prazeres da vida muito a peito. Normalmente porque falo mal de um filme em que pensaram ver a cura de todas as suas moléstias emocionais ou simplesmente gostaram do artista que mata o mau. Ora, quando o pessoal diz à boca cheia que sou um calhau com elevados sintomas de acefalose, incapaz de interpretar conceitos abstratos ou que “era vir um comboio em contra-mão e levar-te”, eu só tenho a dizer que provavelmente têm razão. No entanto, como aqueles que por aqui passam sem ser para ver os artigos que envolvem porno sabem, eu não sou um crítico de cinema. Sou apenas um gajo que aqui se senta ocasionalmente para escrever sobre filmes. Longe de mim almejar tão nobre ocupação. Um plebeu de gama de entrada não pode fazer parte da Schutzstaffel da cinefilia. O que define um crítico de cinema? Que capacidades terá esse guerreiro da luz de possuir para que as suas palavras não sejam meramente um escoar de verborreia indecifrável rumo ao esquecimento?

Um crítico não deve impor os seus gostos. É comum alguém escrever sobre cinema e esforçar-se em demasia para convencer os leitores que devem ver, ou evitar, a todo o custo determinado filme. Às vezes de modo perfeitamente inconsciente, num exercício natural, outras vezes de um modo mais forçado, bullying intelectual. A conversa deve casual, como uma conversa de amigos, respeitando o seu leitor e sugerindo mais uma opção do oceano de possibilidades que um cinéfilo tem à mão a qualquer momento. O crítico é um amigo que está ao mesmo nível do seu leitor, apenas com uma especialidade diferente. Terá que possuir a habilidade de ouvir como de falar. Por exemplo, se um crítico estiver numa esplanada a explanar os seus pontos de vista acerca de determinada obra, deverá preparar-se para ouvir, no final do seu monólogo, uma conversa acerca de filatelia, vidros térmicos ou tecidos inadequados para roupa interior devido ao seu potencial alergénico.

O cinema não é uma arte para elites, é um meio de comunicação para todos. Ultimamente tem-se vindo a criar a ideia de que existem dois tipos de cinema. O comercial para idiotas e o alternativo arty para elites intelectuais. É esta a ideia que tentam passar alguns críticos mais autistas embriagados de erudição. É certo que possuem conhecimentos mais aprofundados que a chamada “plebe cinéfila”, mas isso não os torna seres de magnificência espiritual, pois a despretensão e respeito pelos gostos alheios são belas características de qualquer pessoa, quanto mais num crítico. Quero com isto dizer que me dá volta às tripas ver pessoas que são pagas para escrever acerca de tão popular arte como é o cinema e depois se espumam em ódio de morte acerca da incapacidade mental das pessoas que gostam de determinados filmes, porque quem os vê só pode ser atrasado.

O sentido de humor é essencial. Quando se pergunta a um homem que características pretende numa mulher a resposta dada por esse homem não interessa. É mentira. O que ele quer é C.C.M. (abreviatura para Vagina, Rabo e Seios). Uma mulher diz sempre que quer alguém que a faça rir (além do resto…). Bom, na crítica cinematográfica nacional nota-se uma imensa falta de sentido de humor a abordar os assuntos. Não falo em alguém vestido de palhaço, se sapatões e nariz de buzina, a arremessar tartes de natas e a ouvir “Mulheres que lavam no rego” do Quim Barreiros. Falo de uma capacidade inteligente de abordar os assuntos de modo menos sisudo, sem aquele semblante austero de quem faz parte de um júri de infanticídio. Sentido de humor não são anedotas. Sentido de humor é Woody Allen, Douglas Adams, Doug Stanhope, Tom Sharpe, Ricky Gervais, etc. Esse tipo de escrita que não estupidifica ninguém. Eu associo sempre esta atitude ajuizada com alguma insegurança e o preconceito que “quem faz rir são os palhaços”.

Eu sei o que estão a pensar. Em sexo. E também que eu muito vezes não cumpro nenhum destes requisitos. E eu repito que não sou crítico, sou apenas um parolo que tem um computador e acesso à Internet que quando se vê sobrecarregado de trabalho faz a coisa mais lógica: vira as costas a tudo e escreve num blog.

Faz-se tarde e ainda não abordei os assuntos todos, mas voltarei certamente (com 50% de certeza) a abordar este assunto. Até lá que não vos doa os ossos.

Nota: a imagem que ilustra este post é do meu jornalista preferido, ainda que ficcional. Fossem todos assim e o mundo era um lugar melhor. Spider Jerusalem, personagem principal da BD Transmetropolitan de Warren Ellis.

7 Comments

  1. Joao V

    CCM…. esse grande partido político!

  2. Sofia

    és calhau com elevados sintomas de acefalose, incapaz de interpretar conceitos abstratos (…) e devia “vir um comboio em contra-mão e levar-te”

  3. Maat

    és o meu crítico de cinema preferido. quando estou à procura de um filme para visualizar em casa, venho aqui reler as tuas críticas. és o crítico com mais sentido de humor da internet. posso estar a ter um dia merdoso no trabalho, mas uma crítica tua anima-me sempre. parabéns! continua a ser parolo e a vir aqui descarregar. tenho dito.

  4. Emanuel Neto

    Os críticos de cinema não passam de fantoches que acham que sabem do que falam! Armam-se em intelectuais e no meio daquele paleio todo incluem duas ou três expressões técnicas para impressionar os fracos do sentido! Quando aparecem nas televisões a analisar as temáticas “artísticas” dos filmes de meninas da Hannah Montana e da Julia Roberts despertam em mim algo muito importante: a repulsa e o desprezo!!

  5. Pedro

    Sa foda os críticos de cinema, continua com o bom trabalho de animar a malta e um grande abraço

  6. Paulo Fernandes

    Não preciso que me digam o que esperar de um filme nem qual a mensagem subliminar que transmite, se entendi perfeito, se não entendo vejo o filme de novo ou cago no assunto.
    Como um professor da faculdade dizia: “keep it simple and stupid”, esta sim deveria ser a premissa para quem faz crítica de cinema, porque não somos todos um bando de intelectualóides.

    A devida vénia ao Mestre (sempre) Xunga

  7. Nosca

    A grande maioria dos críticos de cinema são mais bizzarros que os gatos mutantes de três olhos do Transmetropolitan! Continua com a “chunguice” e caga para os críticos!

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