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Frances Ha (2013)

francesha

Invejo esta juventude que se inebria instantaneamente com arte. Que perante uma avassaladora dose de poesia, lirismo ou cinefilia se deixam incapacitar fisicamente com a sensibilidade, como se o talento e genialidade criativa os deixassem em coma catártico e por momentos etéreos padecem de   “Oh my god it’s full of stars”-ismo. Porque eu sou um talego, um calhau emocional incapaz de absorver a beleza artística, mesmo que ela me seja arremessada pela própria incarnação física e cientificamente provada do deus Apolo. Lá vou melhorando com a idade, a experiência. Filmes que achava merdosos passam a fazer sentido, sentimentos que em tempos classifiquei como “de velho” fluem agora livremente por mim. Todo este processo leva o seu tempo, é como os corais ou o musgo, vai conquistando o seu espaço, vai alterando a nossa percepção, amadurecendo. A experiência é, na maior parte das vezes, a maior aliada do cinéfilo lento. Quero com isto dizer que não compreendo como se vêem agora por aí putos com 17 anos que descodificaram o sentido da vida pela cinematografia de Bergman, compilam teses académicas sobre a comoção que lhes causa o neo-realismo italiano ou como absorvem o essencial da vida pelas alegorias neuro-boémias da Nouvelle Vague. Quando eu aos 17 anos nem a moral do primeiro Rambo percebia muito bem. Este excesso de academismo e o atalho na ciclo natural da cinefilia não é, na opinião deste abandonado escrivão, saudável. E assim chegamos a Frances Ha, um filme bonito e de bela representação, mas carcomido no seu núcleo.

Independentemente da nossa orientação crítica perante este filme, temos todos que concordar que a Greta Gerwig é magistral na sua interpretação absorvendo a luz a tudo o que a rodeia. É a Greta que comanda as vidas, pelo menos aquelas do filme. Bons diálogos num incessante matracar que tanto faz sentido como verbaliza espirituosamente surrealismo. A fotografia é interessante, um belo preto e branco. Postiço, é verdade, mas coerente de início ao fim. Houve decoro e supervisão apertada naqueles tons.

O filme é apenas o matracar de Greta e um conjunto de skecthes mal ligados entre si, martelado para fazer sentido e abrupto nas mudanças. Como se o realizador tivesse entregue uma versão de 180 minutos e o estúdio tivesse dito “Oh Noah, é um rico filme sim senhor, mas ninguém vai querer perder 3 horas de vida para ver um filme de um bandalho hipster e obscuro como tu. Corta isso para metade e depois aparece por aqui que falamos melhor.” E o pobre Noah, convencido que já tinha cortado tudo o que era possível teve que desfigurar a sua preciosa obra para que alguém, além da sua mãezinha, o quisesse ver de modo voluntário. Daí aquela sensação de algo decepado.

O estigma Woody Allen também é omnipresente, como um piano de cauda pendente por cima dos personagens. Algo que em Allen fica bem, aqui soa a farsolas. O imprevisível e aleatório na personalidade de alguém só tem piada até aos 25 anos, a partir daí é um risco desnecessário, uma problema patológico, uma bomba instável que ninguém quer ver por perto. Os tempos são também outros, já não se absorve a arte do ar, nem em Nova Iorque. Aquela Frances é uma pessoa que não criou em mim nenhuma empatia. Parece a ex-namorada que todos tivemos, aquela que andava sempre em permanente mudança incapaz de se comprometer com nada mas que nos pedia para esperar que eventualmente as coisa mudariam. Até que nos puxava para o caos e que acabava sempre por confessar que não havia pissa num raio de 50 kms que não tivesse afagado. Resumindo: Caos, imprevisibilidade e incapacidade de gerir os afazeres do dia a dia é algo que me eriça o escroto em horror. Mas isto sou só eu, porque haverá muito boa alma a identificar-se com aquela galdéria e dizer “Ufa, pensava que era só eu.”

É uma história típica das dores do crescimento em que o personagem aprende, eventualmente, a lidar com os seus defeitos, confrontar o seus erros e transpor o obstáculo pessoal que se ergue perante ele o filme todo. E isto soa bem quando é bem feito, quando a sequência das cenas e a evolução psicológica do personagem é suave, sem sobressaltos ou buracos narrativos. Aqui não é o caso. Chega aos 80 minutos da mesma rotina desajeitada e de más decisões e fica logo tudo bom, com que por magia a nossa menina atina. Fica certinha, penteadinha, deixa-se de piadolas e pode ser apresentada à sogra. Sem que o personagem tenha essa motivação ou o salto necessário para que aconteça.

Detesto a forma como o conceito “Awkward” tomou conta do cinema independente americano, agora pejado de patinhos feios, peixes fora de água e pinóquios conceptuais. Tudo sempre enroladinho com lógica hipster das roupinhas da avó, os pés para dentro e o “i don’t give a fuck” porque alguém há-de pagar as contas. Apreciei este conceito as primeiras 500 vezes, depois foi esmorecendo até ao ódio, ódio de morte. Eu sei, estou velho. Sabem que ficava bem neste papel? Era a Zooey Deschanel desajeitada e a espalhar feromonas de donzela em apuros com o clito a latejar.

1 Comment

  1. João

    ó meu, para ti tudo o que não meta mamas é carcomido no seu núcleo. Mas tens razão. Hoje em dia basicamente um par de mamas é de facto o melhor e unico argumento para ver um filme. és um tarado mas eu concordo contigo.

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