Em 1994 tive um reencontro com 9 ou 10 amigos de liceu. Fomos jantar e a noite foi dura. A certa altura estávamos completamente queimados num estado de realidade fortemente alterada. Ninguém estranhava o pinguim que cortava fatias com um florete flamejante multicolor de um bolo que parecia teimar em subir as paredes para encontrar o amor de infância que entretanto se transmutara sob a forma de uma sólida bolha avermelhada que lia um artigo dos Dead Kennedys num exemplar do extinto jornal Se7e. No tecto. Era noite de confidências e um de nós confessou que uma vez uma colega nossa o teria presenteado com um bela sessão de sexo oral e pediu que ele não contasse a ninguém porque era a primeira vez que tinha feito tal coisa, a loucura do momento, envergonhada, etc. Criou-se um estranho ambiente e passados 3 milisegundos percebeu-se que esta história tinha acontecido a todos, à excepção do Sandro, que tinha levado apenas alivio manual. Só parámos de rir compulsivamente quando percebemos que foi tudo na mesmo tarde, numa festa de aniversário.
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Uma das melhores sensações que um cinéfilo pode ter é ver um filme que desconhece por completo e ser surpreendido com uma das mais belas obras alguma vez projectadas num grande ecrã. Aconteceu-me isto com Holy Motors, sugerido por um internet friend aparentemente francês (mas que pode muito bem ser iemenita ou senegalês). Inicialmente não sabia sequer tratar-se de um filme falado em francês, no entanto o assombro foi tal que me vi estupefacto durante duas horas, incapaz do mais ínfimo movimento, no delicado limbo entre o desconforto e o deslumbramento, numa obra que faz fervilhar um caldeirão emocional. Enquanto o cérebro extrapola cenários magníficos como explicação e ramifica a imaginação para terrenos coloridamente psicotrópicos, o cerebelo defende-se do perigo eminente da falta de chão lógico para caminhar. Falamos, portanto, de um filme que nos retira da chamada “zona de conforto” e que nos deixa entregue aos coiotes durante duas horas, nus e frágeis às mãos do hábil manipulador Leos Carax.
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