O sangue jorra num festim imparável de carnificina, miolos e pedaços de osso trespassam as objectivas num infindável jogo de matança sádica, a audiência paralisada de estupefacção espuma de nervoso miudinho e excitação face à postuma justiça para com os crimes do Holocausto, acção tão electrificante que não temos tempo para processar o que acabamos de presenciar. Verdade? Não, mentira!…
Para arrumar já esta crítica e para que os apressados possam já parar de ler e voltarem a pesquisar pornografia, devo dizer que gostei muito deste filme. Mas fiquei bastante surpreendido ao perceber que toda a gente tinha sido ludibriada pelos trailers. Aquilo que disse no parágrafo inicial é aquilo que as pessoas pensarem ir ver neste Inglourious Basterds. Mas eis que Tarantino tira outro coelho da cartola.
O anterior Death Proof tinha tanto de fraquinho como de presunçoso. Tarantino perdeu em casa com Rodriguez, usando uma metáfora futebolística, a primeira de toda a minha vida, diga-se. Tarantino tinha que se reinventar, livrar-se do estigma Pulp Fiction.
E eis que surge este Basterds. Aquilo que parecia ser um filme de guerra spaguetti revela ser uma das maiores homenagens ao cinema de que já vi em toda a minha vida. Tarantino demonstra aqui o verdadeiro amor do cinéfilo, o cinema puro e duro. E além de o mostrar, também o faz.
Magníficos diálogos, como sempre. Cenas compostas e a fugir constantemente ao cliché. Uma fotografia primorosa. Este é mesmo para ser visto no cinema. Não sejam mãos de vaca. E este não e filme de pipocas. Por favor, não massacrem uma visualização de Basterds com a constante ruminância de uma betoneira de pipocas.
É longo? Sim, se comparado com o standard blockbuster ou cinema comercial. É chato? Não, nada… É bastante agradável de ver e as cenas e personagens memoráveis ficarão cravados no nosso cérebro. Acho que aqui se faz História de cinema. Nunca mais ninguém se irá esquecer do pérfido multidimencional Coronel Landa ou do verborreico mimado Goebbels. Nunca caindo na piada fácil nem no óbvio cliché, Tarantino mostra que o outro lado da guerra não é a uniformizada imagem nazi que temos habitualmente.
E violência? Porrada? Matança? Sim, também tem. Sangue, tripas ou o típico bolbo raquidiano a ser esmagado à bastonada estão lá. Só que não é propriamente o Braindead de Peter Jackson. Fantástica banda sonora e uma palete multinacional de actores muito capazes. Grande Mike Myers a fazer lembrar um Austin Powers reformado e calminho depois de uma operação à próstata.
O Hans Landa é das melhores personagens que chegaram ao cinema nos últimos anos. Com aquela personagem, até comer tarte é de arrepiar.
Tenho de ir ver isto. Pelo que descreves será sem dúvida superior ao “Quel maledetto treno blindato” do Castellari.