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Universos cinemáticos, o cemitério do Fanboyismo

CU

Há uns anos escrevi um artigo acerca das razões que me levaram a abandonar a televisão convencional. Não apenas séries, mas toda a programação televisiva que está a passar em tempo real. Resumidamente, as razões que me fizeram abandonar séries de TV é a maneira como são geridas. Se são boas mas têm pouco sucesso comercial, são canceladas ficando o telespectador entalado com as questões que lhe tiram o sono. Se são boas e têm muito sucesso comercial são esticadas em décadas de temporadas, sendo que aquilo que as fazia inicialmente boas é diluído ou transformada numa versão de si própria, mas com sabor a sola de chinelo. E o mesmo está a acontecer com o cinema comercial, o esquema do blockbuster moderno irá colocar em vias de extinção o fanboyismo militante.

Kathleen Kennedy é uma das produtoras mais reconhecidas do mundo. Produziu todo o backbone daquilo que se consideramos “blockbuster” nos últimos 30 anos. O seu conhecimento da indústria e do mecanismo comercial que faz rodar o mundo Hollywoodiano é um dos mais profundos. Numa entrevista violentamente honesta à revista Wired no final de 2015, Kathleen Kennedy assumiu aquilo que todos nós temíamos, os Universos Cinemáticos vieram para perpectualizar sagas, vender bonecos, criar árvores de produtos colaterais e nunca, mesmo nunca, dar uma conclusão satisfatória aos que pagam para que isto aconteça. Todos temos noção que a continuidade do negócio depende dos dinheiros que advenham da comercialização da obra. O problema é que o modelo tem sido subvertido, alterado, tendo gradualmente a sua direcção mudada ao ponto de já não estar a funcionar para nós, a malta que os vê.

Muito nos temos queixado das pragas dos reboots, remakes, spinoffs e side-quels (é novo este, mas foi a Kathleen que o usou, por isso tornei-o oficial). Só que isso era só o princípio, daqueles momentos em que parece que chegámos ao fundo e continuamos a escavar. O foco agora é a continuidade, a perpectualização dos mitos. A sagas serão eternas. Se os dinheiros continuarem a entrar e os lucros a subir, nem os nossos bisnetos saberão o fim das histórias do Star Wars, da Marvel, DC, James Bond (que aposto vai começar a ramificar-se entre episódios para criar “mitologia”) e outras que agora começaram a aparecer. Sempre recicladas, claro. Por exemplo, o reboot dos Power Rangers está aí à porta. Um filme? Não. Trilogia? Nops. Então caralho? Sete filmes sete. SETE. Para uma merda que ainda nem sequer está garantida de ter sucesso. Se, por alguma improbabilidade metafísica, o primeiro Power Rangers for bom mas não der lucro, fica pendurado. Com respostas por dar, porque estava apenas planeado dar 50% das respostas no episódio 7. Afinal quem é o pai da lagosta mutante que a Power Ranger rosa pariu? Nunca se saberá.

Isto não é novo. Tem estado contido. Relembro exemplos de Back to The Future 2 que nos deixou pendurados até ao 3. Que na altura foi um escândalo e eram só 6 meses de espera. Ou algo semelhante em parceks.  Matrix 2. Outra. Tudo furioso. “Caralhos os fodam, então mas agora é assim? Não acabam os filmes? Queimem o cinema, queimem Hollywood, queimem tudo. TUDO!” Ou pior ainda, quando a malta ficou pendurada uns anos entre o Empire Strikes Back e o Return of the Jedi, quando nem havia Internet para as pessoas se indignarem com pequenos nadas, para mandarem fotos dos seus próprios pénis a garotas que acabaram de conhecer ou ameaçar de morte e doenças incuráveis os produtores de Star Wars. Mal eles sabiam que essa iria ser a norma número 1 para sagas e universos cinemáticos na segunda década do novo milénio.

Como prevenir isto? Há uma maneira de ignorar isto, se vos apetecer apreciar os filmes individualmente no longo arco narrativo que irá terminar na inevitável desilusão, em 2145. Basta identificar o elemento unificador das sagas e ignorá-lo. Como? Simples. Normalmente é um vilão obscuro, filmado em pouca luz ou holograma, completamente inumano, feições monstrengas, e que tem frases como “Calma, o nosso tempo virá” ou “Ainda é cedo, meus súbditos, vamos esperar” ou ainda “Enquanto a bonecada e os direitos de autor para lancheiras continuar a subir ou a manter-se em níveis estáveis, esperamos.” Nos Avengers é aquele Hulk azul do World of Warcraft que anda nunca cadeira voadora, no Star Wars é o holograma gigante do Gollum.

Por alguma razão a abreviatura de Cinematic Universe é “CU”. Porque cheiram mal e, à semelhança dos seus criadores, é um constante entrar e sair de energéticos personagens volumosos mas sem grande densidade emocional. 

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3 Comments

  1. Pedro Pereira

    Vê isso como incentivo para fuçar coisas antigas.

  2. pedro

    E há muita coisa para fuçar. Coisas de qualidade superior.

  3. Joao bastos

    É por isso que vou vendo e revendo os filmes que me fizeram gostar de cinema. Chungas dos anos 80/90… Era dourada de Hollywwod; Hitchcock; Jackie Chan de Hong Kong; Stallone 80s/90s; etc etc

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