Uma das piadas recorrentes de Barney Stinson, popular personagem de How I Met Your Mother interpretado por Neil Patrick Harris, era que o verdadeiro Karate Kid seria Johnny Lawrence. Daniel LaRusso foi um principiante com sorte que estragou a meteórica carreira de Lawrence com um pontapé ilegal. E que depois lhe arruinou a vida para sempre, abandonando um futuro promissor, lançando-o para sempre numa vida de álcool, drogas, Rock n’Roll e decadência urbana. Essa tendência da série, para reforçar a sua personalidade oposicionista, acabou por dar origem à série Cobra Kai. E depois, com o êxito meteórico dessa série em todas as faixas etárias, Karate Kid começou a ser novamente um nome pomposo e popular, a criar tendências e a pedir o que se pede sempre: outro filme.
O remake de 2010 em que o Karate Kid, versão nepotismo hollywoodiano, luta Kung Fu e é treinado na China por Jackie Chan, gerou muita crítica negativa. Primeiro porque é Kung Fu e não Karaté e depois porque foi numa fase relativamente longa e aborrecida de Hollywood em que nos enfiavam o filho de Will Smith pela goela abaixo a cada oportunidade. Ainda que este filme não seja a sua pior obra, o certo é que este puto até nos fazia morrer de cringe a cada filme em que aparecia.
E este ano surge-nos um filme que, alegadamente, iria servir para unificar os universos Karate Kid. Se Johnny Lawrence já tinha encontrado paz com o seu ex-adversário, se todos os vilões tinham sido derrotados das mais bizarras e humorísticas maneiras telenovelísticas, havia agora que juntar o universo Jackie Chan ao universo Ralph Macchio para curar o mundo e atingir o nirvana Karatekidiano de uma vez por todas. Enfim, coisas que ninguém pediu.

Este novo Karate Kid conta-nos a história de um puto que vem de Pequim para Nova Iorque, com a sua mãe, tentando fugir dos seus traumas e medos e recomeçar de novo na grande maçã. Ao chegar embeiça-se por uma jeitosa, check, cujo ex-namorado violento e abusador é o campeão de karate da zona, check, e anda num dojo gerido por um corrupto sensei que quebra todas as regras e éticas do desporto, check. E Daniel, desculpem, este puto genérico, que já ninguém se lembra do nome e brevemente da cara, faz o óbvio. Treina o seu futuro sogro nas artes do Kung Fu para este ganhar uma luta de boxe com o objetivo de pagar uma dívida à máfia e manter a sua pizzaria em funcionamento? Erm… ok… Mas entretanto o filme chega a meio e nada disto interessa, esta história é atirada às urtigas, o sogro desaparece, o interesse amoroso eclipsa-se, o objetivo evapora e faz-se um reset à história. O puto chinês de quem já ninguém se lembra entra num torneio de karaté com um objetivo que só deus sabe. Aparece Jackie Chan, convidam Daniel Larusso para criar um “Kung Fu to Karate converter” e através de uma segunda parte feita inteiramente em sequências de montagem e luta, estamos magicamente no final do torneio onde o chinesito enfarda a bom enfardar no vilão que, coitado, só é vilão porque foi assim que o escreveram.
São dois meios filmes que não fazem um, em 90 minutos que acusam um nítido problema de montagem, onde se sente falta de uns 30 ou 45 minutos de filme. As narrativas não têm seguimento, outras começam a meio, não há motivações, só se podem identificar com o herói pessoas que sabem kung fu e a parte Karate Kid é praticamente um cameo mal lambido, um penso rápido que os ciganitos vendem à porta do pingo doce.

Boas sequências de luta que poderiam povoar mais o filme, em vez de apenas visitarem aos fins de semana. Estética que varia entre a telenovela das nove e os novos trailers de GTA 6. Ralph Macchio aparece quase como uma representação em cartão de tamanho real, os personagens são todos bidimensionais e é irritante de tão básico. Desenganem-se os que pensam ver umas migalhas de Cobra Kai, porque a ausência é praticamente total.
Um ótimo filme para adormecer a meio num domingo à tarde depois de uma feijoada de chocos com muita molhanga e pão ou para meter na watchlist para um dia, quem sabe, ver. É incrível como Cobra Kai criou um mundo de possibilidades que poderiam ser exploradas e este guião avança como se tivesse sido escrito e finalizado em 2011 para tapar aquele buraco lógico do remake, que ninguém quer saber. Por outro lado ficamos bem agradados pela ausência de Jaden Smith, facto que só por si vale uma estrela e meia.
Adenda 1:
Reparei agora que existe uma diferença de duração entre o que foi anunciado pouco tempo antes do filme estrear e a duração efetiva do filme que saiu em cinema. Por isso, amiguinho, preparem-se para a edição especial em breve para colmatar esta discrepância de quase meia hora. Provas:


Adenda 2:
Deixo o documentário que, alegadamente, terá dado origem à supracitada teoria de Barney Stinson:
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