Estava no letterboxd a ver listas dos filmes mais marcantes dos anos 2020s e apercebi-me que não tinha registado o Minecraft Movie no meu diário. Corrigi a injustiça e lembrei-me do colossal evento que durante duas semanas foi o centro mundial da atenção mediática, o Chicken Jockey. Logo após a estreia, de modo aparentemente espontâneo, começa a criar-se um ritual em volta da cena em que Jason Momoa é atirado para lutar com um boneco frankenstein que pilota uma galinha. De repente essa cena passou a ser o pânico das salas de cinema, com miúdos a atirar comida, bebida e tudo o que conseguiam encontrar num ritual que parecia Portugal aquando do golo do Eder. Desde galinhas vivas a incêndios em sala, parecia que a civilização ocidental estava prestes a acabar. Entretanto passou e agora parece ter sido um sonho febril.

Na sessão a que fui também aconteceu. A sala estava composta, mais de meia lotação. 80% eram adolescentes da idade dos meus filhos, que me acompanharam. E todos estávamos à espera do momento. Quando acontece o célebre soundbyte de Jack Black, a sala explode em celebração. Não houve destruição, não houve lançamento de comida, só miúdos a gritar em uníssono o bordão e depois uma alegria e excitação contagiante que demorou quase cinco minutos a amainar. E naqueles minutos parecíamos uma grande família, miúdos, graúdos, amigos ou desconhecidos. Foi giro, foi inclusivo, parecia que se estava a viver a vida em vez de se sobreviver à rotina.

A cena em questão

Muito se falou na altura e mais uma vez os velhos do Restelo, que são cada vez mais jovens, atacam com a aparente má educação crescente nas salas, que os miúdos não se sabem comportar, que não respeitam. A minha opinião em relação a isso, de uma pessoa que frequenta salas há mais de 40 anos, é que malta parva com comportamentos desrespeitosos existe em todas as idades, é uma característica transversal à classificação etária. Além disso, este fenómeno de chicken jockey era outra coisa, era uma celebração do cinema pelas gerações que inventaram e ampliaram o meme como forma de celebração da cultura popular.

E também me lembro de um grupo de miúdos da minha escola quando andava no 7º ano. Nesse tempo ninguém validava a idade para ver um filme. Se não fosse porno, entrava toda a gente. E esses miúdos praticavam uma velha arte nascida décadas antes, gritavam frases durante o filme, ora em resposta a uma frase do filme, ora para salientar algo que ninguém estivesse a reparar ou simplesmente para marcar presença. E o objetivo era fazer rir. Havia filmes que eram uma desgraça de tão maus, que aqueles miúdos ajudavam a tornar experiências memoráveis. Não era assim em todas as sessões, mas ocasionalmente, quando recebiam uma notita da avó ou levantavam a nega a matemática, lá iam estes proto-stand up comedians gritar pérolas de humor da escuridão.

Uma vez, no carnaval, fizeram uma mistela à base de leite condensado e milho de lata e durante o filme alguém gritava como se fosse vomitar e atiravam essa mistela para o público. As salas eram gigantes, tinham balcão e a malta da plateia era um alvo fácil. Uns riam, outros gritavam, às vezes havia porrada, mas no final a vida continuava e as coisas ficavam outra vez normais. Bem melhor que apanhar com a tia Guilhermina a fartar-se do filme a meio, ligar o telemovel com som e a iluminação no máximo e começar a scrollar o facebook com a sombra gigante da sua cabeça projetada no teto.

Compilação de reações


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