Este não é um bom filme. Por nenhuma métrica. Em termos de produção apresenta meios reciclados de filmagens de novelas, e mesmo assim restos estragados de cenários, adereços ou mesmo guarda roupa. O estilo de representação de todos, excetuando os titulares Zé e Quim, cai na gama tão temível chamada “representação de revista à portuguesa”. O toque de modernidade, gamado de 300 filmes anteriores, com a presença de Deus, interpretada pelo defunto e mui saudoso Nicolau Breyner, também não ajuda. Digamos que o tom, os temas e o próprio motor narrativo, que serve para agregar um conjunto de sketches soltos, contribui para dar um look and feel que a internet teima em chamar de “Azeite”, esse tão nobre e precioso líquido, ouro mediterrânico. Mas que neste contexto traduz como piroso e sem gosto.
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Quando nos lembramos de Alien, filme de 1979 de Ridley Scott, muitas coisas interessantes nos vêm à cabeça. Não é só facto de ser um absoluto assombro da cinematografia, um misto de terror e ficção científica que continua tão atual hoje com há quase 50 anos, de ser um filme de orçamento modesto que usa a habilidade criativa e a imaginação para o transformar numa peça superior que ecoará nos tempos enquanto houver tempos, que é ainda uma masterclass de cinema. Quer seja em termos narrativos, técnicos ou artísticos, tudo neste filme emana nobreza da sétima arte.
Continue readingDo mais profundo breu abre-se uma fresta de luz quente e acolhedora. Um homem carrega um tronco ao ombro. Não era um tronco normal, não era um homem normal. Era o super tronco carregado pelo seu equivalente humano. Ornamentado por steel drums de Trinidad e Tobago, esta poderosa criatura, capaz de arrancar cabines telefónicas, bancos de carros e derrubar paredes de hotel, transforma-se no pai do ano, mimando a sua filha com gelado e um veado bebé que acabou por trazer para refugar ao jantar, num cena cortada. A música transforma-se e eu deixei nesse momento de sentir peso e fiquei leve como uma pena.
Num profundo estado de contemplação espiritual, encontrei-me imerso numa meditação singular. À medida que a intensidade da minha devoção aumentava, uma sensação de leveza tomou conta de mim. Aos poucos, percebi que estava a desvincular-me do seu corpo físico, como se a minha consciência estivesse a flutuar livremente.
Enquanto pairava por cima daquela plateia, observava o ambiente ao meu redor com uma perspetiva renovada. As barreiras físicas pareciam desaparecer, e senti uma conexão profunda com algo para além do tangível. Uma luz suave envolvia tudo, sentia harmonia e compreensão cósmica.
Neste estado, tive a percepção de que a minha essência transcendia os limites do corpo, conectando-me a algo divino e universal. Esta experiência extra sensorial tornou-se um momento sagrado, onde a fronteira entre o eu individual e o todo cósmico se dissolveu, deixando uma impressão eterna de unidade espiritual. Ouço uma efusiva ovação depois da frase “Let off some steam, Bennet” que me faz iniciar uma espiral descendente. Ao regressar ao meu corpo, carreguei comigo uma compreensão renovada da espiritualidade e uma sensação de paz interior.
Tentei sentar-me novamente no lugar, mas a minha pinhal rectal foi entretanto ocupada por alguém que se auto intitulava “Kanzana Ben”
A magia do Commando em sala, 07 de dezembro de 2023
Reportagem fotográfico pelo André Henriques
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Já agora, sabiam que a famosa cena em que Schwarzenegger transporta um tronco às costas foi filmada num único take. O tronco pesava mais de 50 kg e Schwarzenegger carregou-o mais de 50 metros com a frescura que se vê no filme.
Continue readingPedimos a todos os realizadores para nos mandarem um videozinho para servir de introdução ao respetivo bloco. Concordaram e fizemos uns separadores bem catitas com os nossos amigos a debitar conhecimento antes da sua hora. Ricardo Machado, Luis Alves e Francisco Lacerda contribuíram assim para o aconchego especial deste momento. Bigas Luna, infelizmente, não respondeu ao repto deixando-nos pendurados. Falta de respeito daquele espanhol que, certamente, estará a vender caramelos no além.
Por fim veio a resposta do Filipe Melo. “Não gosto de me ver em video. Nem falar. Pode ser um texto?”. Ora essa, aquele jeitosão que toda a genta adora? Como não gosta? “Vá lá Filipe, não custa nada!”. “Népia!”, respondeu. Sem usar a palavra Népia, claro, que é um homem de cultura. E ainda sugeriu “Mando um textinho, pode ser?”. Senti um *gulp* a aparecer-me na garganta na medida em que sabia a resposta à pergunta que ia fazer “E quem vai ler esse texto?”. Filipe finaliza com uma Fatality “Tu!”. “Jesus H. Cristo!”, pensei. “Já me fodeu!”. Acabei por ficar descansado, porque estava quase a chegar o dia e o texto estava esquecido. “Já me safei. Esqueceu-se de mandar o texto. Yey”. Mas no dia 3, na azáfama do festival, vem a Carla Rodrigues encostar-se ao ouvido e diz “Falei agora ao telefone com o Filipe Melo e ele diz que te vai mandar um texto para leres, ok?”. Fiquei um bocado ansioso, estava ali tanta gente, meu deus. Ainda pensei que provavelmente não haveria tempo, havia que seguir com a sessão. *gulp*. Não queremos interferir na cirúrgica calendarização, o Carlos falecia com tanto atraso. Mas a Carla pega no megafone e diz a toda a gente “Hey pessoal, *som de feedback*, o Pedro vai ler o texto do Filipe Melo, Ok?” Ok?”. E ficou assim definido que eu, Pedro, o amigo imaginário de meia internet que tanto preza ficar nas sombras, teria que enfrentar aquela centena e meia de pessoas e ler o texto do Filipe Melo. Colocarei o texto mais abaixo.
Continue readingA grande novidade do Nalgas Film Festival 2022 foi a inclusão de um grande convidado. Depois de meses de negociação, trocas avultadas de géneros, gado caprino e dinheiro vivo enrolado em elásticos, logística complexa para evitar que a sua multinacional encerrasse ao sábado, o Sr. Joaquim anuiu em comparecer como convidado de honra. À porta, alto e espadaúdo, pimpão, calças vestidas, fazia a recepção cerimonial dizendo aos convidados “bem vindos a casa”. Esta imagem de tamanho real foi criado pela Carla Rodrigues, a mãe do Sr. Joaquim, com as suas maravilhosas mãos de ouro que enaltecem o património das Nalgas. Também ela, a Carlucha, esteve presente no evento com estatuto de Nalga Dourada. Acabou por levar o Sr. Joaquim para casa ao final da noite, deixando o seu namorado, o Pedro, a dormir no sofá. Ninguém pode julgar porque todos nós faríamos o mesmo perante o apelo animal e a atração selvagem que emana hormonalmente pelos poros do Sr. Joaquim.
Continue readingEis que a ampulheta Nalgas esgotou a sua areia e o NFF finalmente chegou. Dia de aprumo, botões de punho, sessão de barbeiro, o melhor sebo para aquele especial brilho nas botas, esporas novas. Roupa interior castanha. Ansiedade ao máximo, tick tack motherfuckers, “é hoje caralho é hoje. Solene silêncio no carro a caminho do evento da década. Eu, o Miguel e o Pedro Nora da Rádio Universidade de Coimbra, o Quentin Tarantino Português. Chegada, almoço, uma inundação de calor humano, as caras acolhedoras que me habituei a ver nos últimos anos. Sorrisos sinceros, abraços apertados, matam-se saudades por altura do Natal. O Rui, estrela máxima da rádio pública nacional, o Sérgio e a Susana da Sala Azul, dupla que ilumina qualquer sala, o enciclopédico e eloquente António Araújo, aquele amigo de infância que só encontramos tardiamente na vida, o Carlos, irmão, parceiro de vida em união de facto, a Mónica com o seu sorriso contagiante, qual ninfa de Homero, o Miguel, outro irmão, e o entusiasmo permanente do Nora.
Continue readingContinua a grande dificuldade dos argumentistas do cinema moderno se adaptarem a novas tecnologias. A necessidade de manter os conceitos do cinema tradicional, para não alienar a clientela, e associar-lhe toda a parafernália de tecnologias atuais nas suas tramas é a tarefa mais dolorosa para argumentistas. É muito comum estarmos a ver um filme em que se ignoram completamente facetas tecnológicas da vida atual. A escrita foca-se numa linha de fuga muito concreta para evitar distrações. A malta de humanidades, que escreve os filmes, não sabe usar as tecnologias que tem, quanto mais compreender a complexidade mastodôntica que lhes dá forma dentro das paredes, na atmosfera, no espaço, debaixo das cidades, em centros de dados e dos seus domadores que operam nas sombras. Mas isso não os impede de tentar, com resultados mistos. Se o casual utilizador de telemóvel para ver fotos da ex-namorada em bikini no whatsapp consegue engolir as instruções narrativas, o geek de gama média rebola os olhos para cima e sai imediatamente do transe da suspensão da descrença.
Continue readingHá dois artifícios narrativos de que não sou grande fã, o found footage e os esquemas manhosos que agora se vêem em todos os filmes de terror para retirar o telemóvel do filme. Da primeira apenas não gosto do formato, que após alguns filmes se torna repetitivo e os 90 minutos de duração parecem 180. Mesmo com todo o contorcionismo e mortais empranchados que se injetam nesse molde, é uma agonia para chegar ao fim, parece que as almofadas do sofá se vão transformando lentamente em xisto pontiagudo. Em relação ao artefato de remover o telefone da narrativa, é uma incapacidade dos argumentistas de se adaptarem aos tempos. Claro que é muito mais difícil resolver os aborrecimentos de ser perseguido por uma família de mortos vivos abusadores sexuais canibais mutantes quando não temos telemóvel. Mas ainda mais difícil seria se não tivéssemos energia elétrica, automóveis, antibióticos, capacidade de locomoção bípede ou utilização do córtex cerebral primário. Ou que ainda não tivéssemos saído da água e fossemos amibas perseguidas por Mosasauros. Falei sobre isso aqui (Artigo: Telemóvel, o terror dos filmes de terror.).
Continue readingAndava aí um filme de terror, que apareceu a voar baixinho por debaixo dos radares, a fazer furor nas salas. Sou daquelas pessoas que dá logo dinheiro a um gajo de aspecto drogado para apanhar o autocarro porque perdeu a carteira ou compra toneladas de produtos em esquemas de pirâmide, mas nisto dos filmes fico muito apreensivo. “Quem são estes agora para me convencerem que o filme é bom? Na volta é malta que acha que Inception é uma matrioska de conceitos, ideias ou situações em vez da criação de algo.” E quando finalmente decidi ir vê-lo ao cinema, depois deste processamento todo, já tinha saído de sala. Há 4 meses.
Continue readingTinha roupa para passar a ferro e acabado de obter acesso a uma conta da Filmin. Embirrei que tinha que a aproveitar. O Sr. Joaquim que tudo fornece nunca me deixa mal, mas ali senti o apelo burguês de consumir um conteúdo pago. Aquele permanente sensação de que é pago e é caro e, logo, melhor. Como os pacóvios que pagam dois ordenados mínimos por um telefone e depois nem sequer lhe instalam apps nem usam demasiado porque têm medo de estragar. E eu, de ferro de engomar na mão, carreguei no play deste Neil Marshall que me piscava o olho sedutor e caprichoso como uma ninfa de Homero, sedento de me ver rebentar os costados nas escarpas rochosas da ilha da morte de onde empinava o rabo.
Continue readingVer um filme de Steven Spielberg é como comer cogumelos apanhados por um amigo bêbedo, pode ser uma extraordinária experiência gastronómica ou pode resultar na perda do fígado e subsequente morte. Assim, com o intuito de acabar com este risco à saude pública mundial, a comunidade científica ligou-me em massa no fim de semana. “Pedro”, imploravam chorando, “Consegues fazer os cálculos de modo a que se consiga erradicar a morte por Spielberg do mundo”, dizia o Alfredo da WHO em Nova Iorque.
E eu lá fui pegar nos tubos de ensaio e microscópios. Trabalhei o fim de semana sem dormir, consegui enviar os dados para um rede de super computadores das principais universidades do mundo para serem mastigados, e consegui hoje ter o resultado desse trabalho.
Apresento o gráfico anual de perigosidade de ver filmes de Spielberg. Atenção que o eixo das ordenadas representa a probabilidade de tirar prazer da visualização e o eixo das absissas representa o mês.
Decidi não patentear o estudo, podem usar nos vossos papers.
Pedro Cinemaxunga – PhD, DoP, ATM e BBC
Cinema não é apenas os filmes que planeamos, aguardamos e vamos entusiasmados ver em sala. Não são apenas os filmes que compramos ou alugamos no Sr. Joaquim e que assistimos em casa, numa espécie de ritual, o escurinho ideal, aquela almofada preferida e às vezes, em dias de batota, uma tacinha de torresmos. Não são apenas os dates para ver filmes detestáveis que toleramos porque o ambiente é propício ao coito. Cinema por vezes também são aqueles filmes que apanhamos a meio, numa insónia de hotel, que têm tantos atores conhecidos, têm meios de produção generosos e algum talento por detrás que nos perguntamos como nos escaparam. Anon é um exemplo destes últimos e a resposta à pergunta “Como é que me escapou?” é “Porque é o pior filme de sempre”.
Continue readingHá imensos relatos de filmes que foram os primeiros a usar CGI. Durante os primórdios da tecnologia digital, os estúdios correram para usar este modernismo que lhes permitia usar como arma de arremesso mercantilista este soundbyte gostoso. Todas as pessoas cuja idade aconselhe um toque prostático ou cuja menopausa avance por si adentro como um incêndio em mato seco têm esta experiência.
Continue readingO cenário é familiar, um grupo heterogéneo de pessoas confinadas num espaço sem saída e sem esperança à mercê de uma sanguinária ameaça. Um a um, coitados, vão perecendo às mãos/garras/facas/ameaça genérica. O herói, improvável, reforma-se de anos de letargia para se revelar o perfeito anti-“ameaça genérica”. A miúda, que sobreviverá seja qual for o reboliço onde a metam, grita em apuros ao mesmo tempo de ostenta a sua permanente hidratação genital pelo herói. Mais do que ser salva e fugir ao cenário dantesco onde se encontra, ela quer ser inseminada, procriar e viver na sagrada comunhão do matrimónio com o herói recém vitalizado. Neste caso são lobisomens e pessoas presas numa carruagem de comboio no meio da mata.
Continue readingA última insanidade de Nicolas Cage é uma espécie de John Wick na Rua Sésamo onde demónios assassinos se apoderam do Ferrão e do Popas para serem trucidados pela força demolidora que apenas um autista consegue ter. Não é o filme perfeito, tens os seus problemas técnicos por inaptidão e fracote na representação, mas ainda assim dá uma bela tarde de sábado.
Ao fim da primeira semana em encarceramento forçado, todas as tarefas se tornam repetitivas. Todos os dias são cópias de menor qualidade dos dias anteriores, a perder cor, e passam a um ritmo estonteante, contrastando com nossa agora permanente catalepsia. Voltando lentamente a cabeça na direção da janela, os dias passam numa cadência estroboscópica, hipnótica. “Que dia é hoje?”, perguntam os membros do quarteto cordas semi-decomposto que me fala do outro lado da sala. “Sei lá!”respondo. “Terça? Domingo? Junho? 1986?”. E os filmes que vi? Vi mesmo ou imaginei? Vou aqui atravessar-me pela minha memória com quase total garantia de que vi mesmo este filme, que ele existe, e vou falar-vos de Butt Boy.
Continue readingSeria de esperar que o remake de Freaky Friday fosse igualmente merdoso e cheio de requeijão teenager, mas de facto somos premiados com 10 minutos iniciais que revelam ao que vamos: sangue, tripas, refinado requeijão pós-moderno e Vince Vaughn ofensivamente transexual. Coisas, portanto, maravilhosas! Um epílogo ao estilo do saudoso Santa’s Slay (2005) com título em português “A Matança de Natal” na chamada “Escola de Títulos Miguel Ferreira das Nalgas”. Uma nova aproximação ao clássico troca corpos que não sendo muito diferente dos outros em estrutura e narrativa, é bem mais divertido e sangrento.
Décimo melhor do ano
Uma das minhas muitas missões de vida consistiu em varrer a filmografia de Brian Yuzna de cabo a rabo devido a um amor profundo pelos dois primeiros ReAnimators, esses soft reboots de Frankenstein e Bride of Frankenstein. Ainda que o primeiro não seja dele. Só o terceiro, que é falso. Uns espanhóis pegaram no franchise e refizeram um Prison Break Reanimator com o Yuzna e o protagonista. A missão não foi totalmente terminada, falta-me Beneath Still Waters e Amphinious 3D que devem ser super bons. Isto tudo para dizer que passei há uns anos pelo Society (1989) e fiquei apaixonadão.
Continue readingPor vezes ficamos a fatiar fiambre no Facebook, a pedinchar sugestões para um filmezito antes de ir para a cama, que nos enleamos em tramas supérfluos de listas de celebridades que fazem branqueamento anal ou dos tipos de melão que melhor curam a SIDA. E entretanto passam duas horas e vamos para a cama sem filme. Neste tempo perdido na névoa do “doce fazer nenhum” podíamos ter visto o Wolf of Snow Hollow, o novo filme de Jim Cummings, o jovem hiperativo reativo emocional psicótico realizador/actor/”faz tudo no seu próprio filme” que fez um brilharete com a curta Thunder Road que depois deu a longa Thunder Road.
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