Cru, orgânico, chocante, Cronenberg… É este Cronenberg que nos assusta, que nos faz ter pesadelos apenas mostrando a natureza humana, sem recorrer a fantasmas, assassinos de motosserra ou ataques de monstro na baixa. É apenas a carne, o desejo, o poder, a loucura ou o simples líbido. Cronenberg mostra o outro lado, o lado que não mostramos na padaria nem no centro comercial. É o lado não filtrado da humanidade em estado puro, primordial e visceral, aqueles instintos que ainda nos restam do tempo dos tigres de dente de sabre. É este Cronenberg que idolatro!
Viggo Mortensen volta a aliar-se a Cronenberg e tenta escovar do seu corpo o pivete de Aragorn, tentando evitar o typecast, fugindo ao pânico de fazer filmes de fantasia para o resto da vida. Nem que para isso tenha que aprender russo ou andar à porrada todo nu, expondo mais do que aquilo que queremos ver. Dá-me ideia que esta dupla Cronenberg/Mortensen está para durar. Nice career move, mr. Mortensen! Naomi Watts continua extremamente apetecível e credível naquele ar de mulher que queremos levar para casa e tomar conta dela e, quem sabe, aproveitarmos a sua aparence fragilidade para jogar ao “adivinha o que tenho no bolso” de olhos vendados. Quanto a Vincent Cassel, posso dizer que o continuo a ter na lista dos actores favoritos. La Haine, mon ami, la haine!
Eastern Promises é um filme actual que evita falar do tema de frente mas que o torna omnipresente, como um fantasma incómodo ou uma refeição indigesta. Através do diário da prostituta morta vemos como são atraídas jovens russas (e não só) cheias de sonhos para as garras do negócio da noite, fazendo delas produtos com data de validade, produtos a gastar e deitar fora. Cronenberg também nos mostra como o mais doce vizinho ou amigo da família facilmente se transforma no tio pedófilo.
Cronenberg não perde tempo com ninharias, sabe a diferença entre o essencial e o superfluo. No geral é um filme fabuloso mas difícil. Duro, e como disse acima, de digestão difícil. Torna-se mais fácil ignorar do que assimilar a mensagem.
O Sr. Mortensen está a dar cartas e a jogar duro: o seu recente THE ROAD (que recomendo vivamente!) é uma das melhores provas que aquele mocito ainda vai dar que falar durante muito tempo. E Cronenberg e ele preparam-se para uma terceira colaboração onde Mortensen vai fazer de Freud, no less!
http://mausdafita.blogspot.com/2010/02/top-5-filmes-apocalypse-now.html
http://mausdafita.blogspot.com/2010/03/filmes-em-producao-talking-cure.html
Ponho a questão. E se Cronenberg tivesse realizado The Road com o sr. Mortensen?
Sairia dali mais qualquer coisa, não?