Numa altura em que um filme que conta a história de um pneu que ganha vida e, ainda por cima tem o poder de telecinese, é encarado pela comunidade de cinéfilos com dois bocejos, já nada consegue surpreender aqueles que consomem cinema há mais de duas semanas. Por muitas artimanhas e conceitos originais que se injetem numa história há sempre, pelo menos, meia dúzia de precedentes que o fizeram com mais sucesso. Sendo assim, resta-nos ter fé no cinema e esperar que esta falta de originalidade possa ser substituída por uma direção competente e uma narrativa que se saiba aguentar até ao final sem levantar sobrancelhas.
Em Source Code o jovem realizador Duncan Jones sabe contornar habilmente as falácias que um filme com estas características poderia facilmente criar e faz avançar o filme numa direcção bastante mais interessante daquela que tememos nos primeiros 15 minutos. Noutra situação este filme poderia facilmente viver pendurado num possível twist final, fazendo o cinéfilo obcecar dolorosamente por 90 minutos para ser, muito provavelmente, enganado. Duncan despacha esse possível twist ali a cerca de um terço do filme e segue pelo caminho do suspense, do mistério e do questionar da ética científica que cada vez mais se prostitui ao elevado capital das máquinas militares mundiais.
E suspense é o que temos. Peça a peça vamos montando um puzzle. O artefacto narrativo é uma experiência científica capaz de fazer uma pessoa reviver os últimos 8 minutos de vida de outra pessoa, mas o objectivo é saber o que realmente aconteceu naquele comboio. Tentativa após tentativa, Jake Gyllenhaal vai revivendo os tais 8 minutos e reconstruindo quebra cabeças.
Não se trata de pura perfeição, o filme tem as suas falhas. Quando se descobre o culpado da trama (o obrigatório bad guy) o climax não é o fogo de artíficio orgásmico que se poderia esperar. É mesmo um anti-climax de tão mole ser. Talvez seja propositado, talvez seja um soft spot que não mereceu a atenção devida. Era um filme que merecia um final mais transdimencional, um final que honrasse um pouco mais o multiverso e todo possível caleidoscópio de desfechos que podia ir da simples vitória do bem até a uma ruptura recursiva do tecido espaço temporal com um vortex a reverter o planeta ao seu estado primordial, mas em borracha cor-de-rosa numa sociedade distópica governada por mesinhas de cabeceira com monóculos e risco ao lado.
É bom ver reconhecido o trabalho de Duncan Jones em Moon, sem o qual nunca teria a possibilidade de realizar este filme de orçamento mais composto e orientado para outros públicos. Cá estamos à espera de mais trabalhos deste homem que certamente terá uma carreira grandiosa pela frente.
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Detestei este filme. Quer dizer, nao detestei o filme em si, mas deixou-me desconfortavel (no mau sentido. no de nao fazer sentido). Anyway, escrevi sobre ele no meu blog a explicar exactamente o porquê de nao ter gostado…
Mas apesar de tudo, continuo esperançoso em relaçao à carreira do realizador, já que tambem adorei Moon.
Estou admirado, este filme deves tê-lo visto no cinema… Que eu saiba, por enquanto, ainda não há nenhuma outra forma “decente” de o ver.
O costume é a critica sair poucos dias depois de um R5 ou parecido.
Fiquei curioso com o filme, de tal forma que até me dei ao trabalho de ir ver o trailer ao youtube.
Estás a chamar-me piratão?
Epah, não quero chamar nada a ninguém… mas é o que se tem visto, posso te fazer uma lista de filmes em que a tua critica saiu 2 ou 3 dias depois da relase em r5, e que secalhar até foi antes da estreia do filme nos cinemas em Portugal!
ehehe
Por isso fiquei admirado, como não acredito que visses um filme em ts, com certeza pagaste o preço do bilhete, ou então pagaram por ti, não sei…
Yeah… you know… só agora comento.
E comento porque desta vez escreveste mesmo sobre o filme em questão verdadeiramente e não um habitual devaneio com o ponto de partida num filme (mas também gosto dessas, são hilariantes).
A critica é, como o sabes da minha parte, de cinéfilo que sabe o que está a dizer e desta vez sem se camuflar entre atalhos wild, algo que apreciei imenso.
Bom texto, que na tua estilização (e por momentos parecia os tempos da Take), há algumas deixas a registar muito bem depuradas, mas sobretudo a: “já nada consegue surpreender aqueles que consomem cinema há mais de duas semanas”… que é um dos teus melhores pontos altos há muito tempo, mas muito tempo mesmo. Pronto vá, até agora, talvez há umas boas duas semanas a melhor… e isso é que é muito tempo.
Come back! 🙂
Obs: Este Bruno… é um detective mesmo! Não nos assustes, man! Ainda para mais a tirar o tapete desta maneira…
Falando por mim, eu não gosto nada dessa modernices: R5… DVDrip… BDrip… Blu-rayx264… nem procuro legendas srt… Nada! Nadinha… E até digo mais: nem sei o que é isso… e até diria que o meu disco externo está cada vez mais vazio (de Gbs livres… eh eh eh).
Este inquérito antes de se submeter um comentário funciona tipo “coito interrompido”…
A ti só te digo: andas a perder qualidades. Num texto de cinco parágrafos não vi escrito: testículos, mamas, sexo, gajas… nada.
Gosto mais de ti wild – sim Arm… you’re word 😉
Agora só voltei para carregar no “Subscrever comentários futuros neste post”, porque me esqueci de o fazer no outro.
Obrigado
Eu digo que já sentia saudades… dos clean-posts do Pedro bastante objectivos.
Recupero isto “a história de um pneu que ganha vida e, ainda por cima tem o poder de telecinese” para pedir encarecidamente que fales do Rubber, só porque é coisa boa.
falem aí do Biutiful sff 🙂
Não é o Moon mas é bom, escapa aos clichés e, mais importante ainda, fazendo de certa forma lembrar o Dejá Vu (possivelmente o pior filme da minha vida) consegue manter a coerência da história e safar-se com um final engraçado. Gostei