Um dia os irmãos Coen ofereceram ao George Clooney um saco de arroz. Um arrozinho do mesmo que eles usam, de qualidade, do melhor que se come por aí. Ofereceram-no cru, note-se. Deram-lhe umas receitas de como o cozinhar bem e o Clooney lá foi todo contente para casa com aquele saquinho de arroz. Chegado ao lar, tira uma panela da gaveta e mete-se a cozinhar. Com falta de experiência no ramo do cozinhar arroz, Clooney enche a panela de arroz até ao topo. Além disso mete-lhe todos os condimentos que tem na prateleira das especiarias, só para dar mais sabor e para agradar a todos. Quando a água começa a ferver, o arroz começa a subir e a sair da panela. Clooney, aflito, ajusta a temperatura, remove algum arroz para outra panela. Bom, no final fica com um arroz meio merdoso e com sabor demasiado intenso e sem identidade, com a cozinha numa lástima e com um sms dos irmãos Coen a dizer que para a próxima só lhes mandam dois ovos para estrelar.
Para aqueles entre nós incapazes de compreender conceitos abstratos, a génese deste filme está num argumento que os irmãos Coen tinham engavetado desde sempre porque não lhe acharam maneira de o materializar em filme. Um dia Clooney foi lá jantar a casa. Neste exercício especulativo vamos ter os irmãos Coen a morar na mesma casa. Clooney bebe uns copos de vinho e fala-lhes nesta sua aspiração de ser um realizador a sério. Os filmes que realizou têm algum respeito pelos seus pares, mas precisa de uma catapulta para as massas. Ninguém viu Good Night and Good Luck, Confessions of a Dangerous Mind ou o The Ides of March. Só os tolinhos do cinema, bloggers, críticos e outros players da área que não frequentam festas nem são grandes fã de cocaína. E os Coen, também já toldados pelo vinho deram-lhe este guião. E riram muito, aquele riso do Mutley (cão do Dick Dastardly nas Wacky Races) quando o Clooney se ausentou trémulo e imensamente ébrio.
Os temas são marcadamente Coen, a disfuncionalidade que se esconde debaixo de uma fina camada de normalidade e costumes sociais, a família perfeita que cuja aparência desmorona como um castelo de cartas ao longo dos dois primeiros atos, a extrema violência injetada na banalidade do quotidiano e os subjacentes temas sociais que englobam o contexto histórico e socio cultural.
Clooney, mesmo recorrendo a uma dose dupla de êxtase sob a forma de duas Julianne Moores, faz-se acompanhar pelo mortiço Matt Damon nesta epopeia da deconstrução do ideal americano dos anos 50 e 60. Enrola a negridão da narrativa principal com umas lianas de racismo, só para enfeitar e fechar o filme com o punchline das novas gerações que irão salvar o mundo e há coisas que são imunes ao racismo. Isto, claro, depois do mar de corpos que fica pelo caminho.
Se os Coen não sabiam dar-lhe a volta, Clooney ainda menos unhas teve para conduzir este projecto. Não se trata de um filme horrível, é apenas esquecível e um desperdício de recursos. Humanos, financeiros e intelectuais. Salva-se a parte visual do filme que incorpora fielmente a fantasia que temos da américa pristina dos anos 50 e 60, dos milkshakes, holahoops e do twist.
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