Esta semana foi a queima das fitas de Coimbra. Tenho vindo a acompanhar novamente este evento académico, porque os meus filhos e sobrinhos estão já a começar o seu percurso no Ensino Superior. Um gajo vai-se inteirando das novas modas. Por exemplo, já não há garrafas de vidro, o cortejo é super organizado, os concertos das noites do parque são uma merda e as miúdas agora mijam de pé com as amigas à volta a tapar com as capas. Antigamente mijavam de cócoras, mas as bêbedas das amigas estavam sempre a levantar as capas e qualquer pessoa que passasse na rua tinha acesso a uma versão local d’A Origem do Mundo de Gustave Courbet, em 3D com cheirinho. E uns salpicos se se aproximasse demais.

Nota científica: A vontade de urinar de estudante bêbedo, conhecido como O Geiser Super-Bock, está comprovada cientificamente como uma das mais potentes propulsões de fluídos registado em laboratório pela ciência. O mais próximo que se lhe chega é o Sr. Peter North, conhecido como “O Leiteiro”, mas numa área diferente do human geisering.

Ora, quando eu era estudante, os nossos pais não sabiam em concreto o que andávamos a fazer. Iam ver-nos nos cortejos e achavam piada a ver os filhos ligeiramente tocados. “Ai que giro, o meu filho bêbedo. É tão raro, até lhe faz bem de vez em quando”. O filho, que se embebeda e fuma ganza todos os dias desde os 16 anos, sorria, aceitava a notita de 5 contos para comprar um sabonete de xamon à noite e ia à sua vida. Hoje os pais são um seca. Acompanham os miúdos e vão dizendo passo a passo “No meu tempo, nhó nhó nhó“, “quando fui finalista lé lé lé” e em vez de deixarem os miúdos em paz, acompanham-nos até à exaustão sem saberem interpretar os olhos deles. “Foda-se, deslarguem-me a braguilha que eu quero ir divertir-me com os meus manos. Chilem putos, que a noite é jovem.” Pobres crianças que perderam o direito às emoções novas, onde tudo lhes é servido como uma sensação herdada dos pais, em segunda mão, usada, meio avariada e sem brilho. E assim os miúdos ficam ressentidos, só os memes e o humor seco e minimalista da geração Z os salva desta tentativa constante dos seus pais helicóptero insistirem em parecer “modernaços”.

E o mesmo se aplica ao cinema. Os miúdos têm que gramar constantemente com as sagas que vieram dos seus pais, ajustadas ao péssimo gosto cinematográfico dos anos 2020s. Desde Star Wars, Karate Kid, Ghostbusters, Terminator, Rambo, Die hard, Predator, Evil Dead, Tartarugas Ninja e até os Goonies se preparam para regressar. Os pais acompanham super excitados “No meu tempo blá blá…”, “Quando vi este filme pela primeira vez blé blé….”, e os miúdos metem o sorriso forçado porque os pais não percebem que eles ali estão só para terem uma conexão com os progenitores, não porque querem ver o Palpatine regressar do vazio existencial depois de 40 anos a construir naves sozinho com as próprias mãos numa colónia esquecida da orla da galáxia ou Gozer the Gozerian a regressar da sétima dimensão do inferno só porque alguém achou piada ao facto de se refazer a pergunta “Are you a God?” e a resposta do Ghostbuster de serviço que ainda não morreu de idade avançada ser “Yes!”.

E assim fui ver o Rocky IV com o meu filho mais novo. Tem 11 anos e gosta muito dos filmes que via quando era praticamente da idade dele. Não sei se por querer um conexão comigo, para se sentir mais perto, ou se é síndrome de Estocolmo. Ou porque não se faz nada decente de novo e é preciso mungir velhas glórias. Seja como for, estar junto dele por 90 minutos para mim é suficiente. Podíamos estar a ver tinta a secar, seria para mim uma experiência 5 estrelas mais coraçãozinho.

O Rocky IV, aqui que ninguém nos ouve ou nunca ninguém irá ler porque já ninguém lê, é um filme que tem vindo a perder muita qualidade desde aquele dia que o vi na estreia com 15 anos. Uma criança impressionável que escreveu ROCKY IV num portão, usando um prego para vincar a tinta, e apanhou a bom apanhar porque era assim que se corrigiam comportamentos e o certo é que nunca mais repeti. Estes anos passados nota-se que é um produto do seu tempo , um filme propagandista anti-soviético, patrocinado pela política americana que facilitou a sua penetração na URSS pelas vias do mercado negro e pelo Videoclube do Sr. Joaquim deles. É um filme muito vazio que apela ao coração e que tem pouco para mostrar em valor próprio. Ainda assim é uma obra que muito estimo porque me sinto sempre uma criança a cada vez que o vejo. E olhem que não são poucas.

Deixo o episódio do podcast que fiz com o miúdo. Santo domingo e avé maria.


Discover more from CinemaXunga

Subscribe to get the latest posts sent to your email.