Continuação da análise ao que de melhor vi no ano que passou. Tal como todas as boas listas é desonesta, parcial e incompleta, um trabalho em progresso. Ou porque me esqueci de alguns ou porque ainda não os vi todos. O tempo lhe fará justiça.
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Agregar filmes em listas é uma maneira rápida de falar do que fomos esquecendo ao longo do ano. Já fui mais apologista das listas e dos tops, mas também já fui menos. Vou dar início a um série de artigos em que abordo o que se passou em 2014, nomeadamente na área do cinema. Fora o cinema as coisas não correram mal, nasceu o meu terceiro filho e aprendi a amar o caos do dia a dia, a doce carnificina dos extintos tempos livre e a aceitar que por vezes é normal chegar ao trabalho com uma mancha de 10cm de vómito de bebé nas costas. Uma das vantagens de ter pouco tempo livre é que o apreciamos mais e aqueles valiosos 90/120 minutos que nos restam ao final do dia, já a roubar sono madrugada adentro, terão que ser gastos em algo que valha a pena. Falemos em 2014 com uma taxa de erro de um ano. As datas de lançamento são sempre caóticas por causa dos festivais, das estratégias comerciais das produtoras e outros factores nos quais cagamos de alto. Este foram os meus filmes de 2014.
A história que vos vou contar pauta-se pela verdade, daí haver um ou outro pormenor mundano que vos possa enfadar. A realidade é assim, sem efeitos especiais nem jumpcuts. Eram 5 da tarde e deslocava-me no Metro Mondego em direção à estação dos Hospitais da Universidade de Coimbra, aquela com ligação ao TGV e os 5 parques subterrâneos climatizados a Hélio 21 Oxidoplasmático. Um roliço trintão de chapéu de feltro (vulgo Fedora) falava de cinema a duas caloiras de Enfermagem cujos seios pareciam tentar escapar por cima a uma indumentária 2 números abaixo, tops de licra apertados capazes de provocar paralisia respiratória a um possante equídeo. O rapaz concluía o seu raciocínio “… e esse senhor é o Tim Burton!”. As raparigas jaziam deslumbradas e a mais loura disse “Adoro o Tim Burton, Alice no país das maravilhas é um dos meus filmes de infância preferidos.” O rapaz do Fedora sorriu complacentemente e retorquiu em modo guru. “Não miúda, não é esse filme que estou a falar, é outro, um clássico, dos primeiros da sua carreira. O Planeta dos Macacos.” Arregalei os olhos acima do meu escalpe e pensei “Caralhos te fodam, atrasado do caralho. Pregar-te os colhões à linha do comboio era pouco”. Virei o olhar para a janela no momento exacto que passávamos pelo glorioso túnel de Celas adornado com a arte retroiluminada de Garth Ennis. Enquanto me sentia superior cheguei à triste conclusão que há realizadores que gosto mas conheço pouco da sua fase inicial da carreira, como o Abel Ferrara (por exemplo). Não me deixei, porém, abater por esse excesso de realidade e voltei às minhas fantasias de superioridade moral, essa sensação que os mantém afastados do suicídio. O desdém para com aquele miserável ajudou a equilibrar as minhas directrizes de vida e a elaborar um rápido top 5 de Abel Ferrara da fase que melhor conheço.
Há uns meses comecei a ver Into The Void de Gaspar Noé. Não sendo muito acessível é, sem dúvida, um grande realizador. O filme estava-se a compor, boa introdução e buildup, muito bonito, muito bem realizado. Etéreo, colorido, modernaço. Planos gloriosos, cenas compostinhas, representação cinema 2.0 com o típico toque de hiper-realidade, abundância de belas mamas, coisas que enriquecem sempre a experiência cinematográfica. Ora, rapidamente este filme resvala para a mais deprimente miséria infligida a duas crianças num flashback se torna a coluna vertebral de todo o filme. Não é um mero momento de passagem, o Noé usa-o como cavalo de batalha, espanca-nos com o conceito. Quis o acaso do momento que esse casalito de irmãos que sofre as mais nefastas bofetadas do destino tivesse a mesma idade dos meus dois filhos mais velhos. “Foda-se, não aguento esta merda!”, pensei. “Que peso aterrador, difícil de respirar…”. Imediatamente carreguei no STOP, só que estas coisas não desaparecem assim. Até a minha mulher me perguntou que cara de carneiro mal morto era aquela e eu respondi prontamente “Nada, continuo viril com um talhante prussiano.” Durante dias aquelas visões atormentaram-me. Olhava para os miúdos a brincar e pensava nas pobres crianças do filme. Acabou por desaparecer com o tempo mas o certo é que há filme difíceis de ver quando temos filhos. Filhos que sabemos existir e que amamos. Não me estou a referir a bastardos que ficaram no ultramar ou daquela galdéria a quem demos 80 contos em 1986 para ela ir fazer um aborto e ela guardou o dinheiro para comprar uma televisão a cores, teve o puto e apareceu 18 anos depois a pedir dinheiro para a faculdade quando o puto afinal até era repositor de stocks no Minipreço e nunca tinha passado da terceira classe.
Andei às voltas com os papelitos na minha carteira e decidi compilar num artigo um manual que possa fazer qualquer azeiteiro do tunning num especialista em Sylvester Stallone, porque os mais velhos se estão a reformar e não há especialistas suficientes para os substituir. Ora aqui fica então um “10 coisas que provavelmente até sabias sobre Stallone mas nunca te debruçaste muito sobre o assunto.” Com extras.
2012 foi um ano normal, como todos os outros, carregado de cinema horrível nas nossas salas. Apesar da oblonga lista que tinha aqui à mão, consegui reduzir o “crème de la crème” da mais hedionda ignomínia ao nosso bom gosto cinematográfico a 5 fétidos itens. Sem mais delongas nem insinuações sexuais (sob a forma de impropério gratuito ou história de contornos softcore) deixo-vos 5 filmes capazes de fazer murchar a mais viçosa flor.
Em 1994 tive um reencontro com 9 ou 10 amigos de liceu. Fomos jantar e a noite foi dura. A certa altura estávamos completamente queimados num estado de realidade fortemente alterada. Ninguém estranhava o pinguim que cortava fatias com um florete flamejante multicolor de um bolo que parecia teimar em subir as paredes para encontrar o amor de infância que entretanto se transmutara sob a forma de uma sólida bolha avermelhada que lia um artigo dos Dead Kennedys num exemplar do extinto jornal Se7e. No tecto. Era noite de confidências e um de nós confessou que uma vez uma colega nossa o teria presenteado com um bela sessão de sexo oral e pediu que ele não contasse a ninguém porque era a primeira vez que tinha feito tal coisa, a loucura do momento, envergonhada, etc. Criou-se um estranho ambiente e passados 3 milisegundos percebeu-se que esta história tinha acontecido a todos, à excepção do Sandro, que tinha levado apenas alivio manual. Só parámos de rir compulsivamente quando percebemos que foi tudo na mesmo tarde, numa festa de aniversário.
Tops. A velha arte de não dizer nada de verdadeiramente relevante marinado num molhinho de erudição. São escritos incontestáveis devido ao seu cunho pessoal, o último refúgio de um cobarde. Desde que Adão fez o seu Top 1 de “melhores gajas aqui da zona” (que não incluía Eva) que se tornou tradição ordenar itens relacionados entre sido por métodos manhosos numa escala de elevada subjectividade. E com este bloco de texto jeitoso passamos à fase final da nossa lista, uma promessa eleitoral que irei cumprir.
Em primeiro lugar devo fazer um pequeno reparo antes de começar aa escrever este post que gozará certamente de grande popularidade a título póstumo assim que a Internet seja descoberta em 2587 nos destroços da Terra por historiadores do planeta Keppler 22 ou Fomalhaut b (quem chegar primeiro): este top não é uma verdade absoluta suprema a aplicar como norma, é o meu top. Na realidade nem sequer é o meu top real, uma vez que amanhã ou para a semana já tenho outras escolhas e até neste preciso momento existem filmes que gosto mais mas que não me lembro porque estou a ficar com o cérebro todo carcomido da velhice e de abusos de outrora. São pequenos malefícios que se teriam evitado se tivesse feito sempre o que a minha mãezinha me disse. Comecemos que se faz tarde.
Continuando para mais 5 filmes que não têm o crédito que merecem:
Last Action Hero (1993)
Schwarzenegger e John McTiernan apostam numa esquema narrativo inovador e num humor refinado baseado na referência cinematográfica, cultura pop e no status do próprio senador. Incompreendido pelas massas que esperavam outro Terminator abrutalhado, violento e desprovido de auto-crítica, falhou violentamente nas bilheteiras, foi largamente apupado pela crítica e, se não me engano e não me apetece googlar, ganhou os mais incompreendidos Razzies de que há memória. Last Action Hero é um filme intemporal, pejado de imaginação, complexo e será para sempre querido por todos aqueles que no início dos anos 90 ainda tinham o senador exterminador na sua lista de actores preferidos.
Filmes fabulosos espezinhados pelo passar dos tempos, porque o timing da estreia foi errado, porque algum elemento do próprio filme ofuscou tudo o resto. Todos nós temos uma lista de filmes que achamos ser menosprezados pela comunidade cinéfila mundial, filmes que mereciam um lugar nas estrelas e por vezes não chegam a ser um rodapé fugaz de um livro obscuro. Apresento-vos a lista de filmes que penso serem injustamente desconsiderados pela comunidade. Não os vou numerar. Esta é a minha primeira lista de 5 pérolas esquecidas.
The Adventures of Baron Munchausen (1988)
No fim de semana passado, meio adormecido, fiz um zapping preguiçoso pelos canais de cinema. Meu Deus, estariam os meus olhos a pregar-me partidas? Estava a começar a Fantástica Aventura do Barão. Esta obra prima de Terry Gilliam marcou a minha juventude e é um daqueles filmes que idolatro, mas que raramente encontro alma gémea cinéfila com quem possa trocar referências. Um inebriante cheirinho a Monty Python, como que a fazer ecoar a sua memória até aos dias de hoje. Terry Gilliam é, no mínimo, semi-deus. (Tirando os Irmãos Grimm, filme pelo qual merece ser torturado com uma pêra rectal*)
Todos nós temos que lidar com a existência de filmes no nosso plano dimensional que só por si justificamo fim da liberdade de expressão. Tudo bem, desde que não sejamos importunados por eles. Mas isso era antes. Antes de haver 1382 canais de TV e video on demands e infernais quantidades de conteúdo semelhante a uma lixeira a céu aberto que ejacula milhares de horas de programação de inenarrável fedor para dentro dos nossos lares sem pedir permissão. Elaborei uma lista de 5 desses filmes que toda a gente adora, mas que nos fazem secretamente sentir a gonorreia de mil leprosos a cada vez que os apanhamos num zapping.
5. Pretty Woman (1990)
Um principe encantado dos tempos modernos enamora-se por uma prostituta de rua depois de ter pago uma fortuna para não lhe tocar sequer. Nem uma mamada ou um dedinho curioso… Nada. Quando penso em putas de rua, daquelas que atacam à noite nas avenidas escuras das grandes cidades só me vem à cabeça o seguinte: herpes, gonorreia, sida, cocaína, heroína, toxicodependência, alcoolismo, dentes todos podres, hálito a cadáveres em decomposição desde 1996 e mais três tipos de Sida (daquela que corrói o latex). Daí a dificuldade que tenho em assimilar aquele argumento.
1 – Snatch (2000)
2 – Spirited Away (2002) – A viagem de Chihiro
3 – Butcher Boy, The (1997)
4 – Muppets From Space (1999)
5 – Lord of the Flies (1963)
6 – Space Truckers (1996)
7 – Babe (1995)
8 – Mad Max Beyond Thunderdome (1985)
9 – Chona, la puerca asesina (1990)
10 – Espírito de Porco (1957)
:: Notas ::
– Prémio especial do júri para Space Truckers, onde os porcos eram quadrados (cúbicos, vá!) para serem transportados em gigantescos camiões espaciais. O filme era tão mau que esqueci-me de tudo menos dos porcos…
– Chona, la puerca asesina é uma curta metragem que nunca encontrei (mas tentei). Ainda não vi, mas parece que é a história de uma porca que bebe um líquido radioactivo e entra numa onda de serial killer. O típico filme de animais que bebem líquido radioactivo…
– O número 10 da lista, Espírito de Porco, nunca vi nem sei o que é, mas como só me lembrei de 9 títulos e era um top 10, tive que procurar. Nunca se ouviu falar de um top 9…
(EDIT)
Gato Preto, Gato Branco (1998) – Um porco consome um automóvel duranto o filme.
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