Felizmente o cinema actual não é só decadência e unidimensionalidade. Enquanto que o mainstream nos empurra pelas goelas abaixo pastelões desumanizados e inteiramente prostéticos, alguns autores lutam por manter o seu cinema activo. Amantes das artes antigas, dos artesãos da velha escola, tentam honrar os seus ancestrais elevando um pouco a fasquia. Esta tipo de realizadores, os autores, são transversais ao próprio tempo, não se definem num estilo, mas numa vontade que é, obviamente, o cinema na sua linguagem mais pura e honesta. Autores como Woody Allen, Roman Polanski, Quentin Tarantino, Lars von Trier, Wim Wenders, Pedro Almodovar, John Waters, David Cronenberg, Takashi Miike, Michael Haneke, Alfonso Cuarón, Paul Thomas Anderson, Terry Gilliam, Alejandro González Iñárritu, Takeshi Kitano, Jean-Pierre Jeunet, Martin Scorsese, Jim Jarmusch, Michel Gondry ou mesmo Manoel de Oliveira. Só para falar nalguns mais mediáticos e que de repente me vêm à cabeça. E, claro, o perfeccionista mais obsessivo compulsivo da actualidade, o fantástico Sr. Wes Anderson.
Tag: David Cronenberg
Não há dia que passe sem um iluminado nas ciências do comportamento vá a um noticiário da TV dizer que a Internet nos está a roubar o cérebro. Que a quantidade de entretenimento e tecnologia que nos obriga a constante multitasking nos está roubar a imaginação e capacidade de raciocínio. Se isso é verdade não sei, porque costumo estar a enviar um sms, a ler o rodapé do telejornal, a colocar “likes” nas fotos dos meus amigos, a tirar fotografias pela janela da minha vizinha em cuecas e a aprender uma língua estrangeira na PSP enquanto esses senhores falam. Normalmente saco depois o podcast para armazenar no disco e nunca mais ouvir. Videodrome avisou-me que isto ia acontecer mas eu não quis acreditar. Hoje em dia quanto mais CGI porn vejo nos blockbusters actuais, mais idolatro Videodrome. Mais do que um filme visionário acerca dos malefícios da multimédia para o nosso livre arbítrio, Videodrome é uma obra prima que marca o início do reinado da “nova carne” de Cronenberg.
Cru, orgânico, chocante, Cronenberg… É este Cronenberg que nos assusta, que nos faz ter pesadelos apenas mostrando a natureza humana, sem recorrer a fantasmas, assassinos de motosserra ou ataques de monstro na baixa. É apenas a carne, o desejo, o poder, a loucura ou o simples líbido. Cronenberg mostra o outro lado, o lado que não mostramos na padaria nem no centro comercial. É o lado não filtrado da humanidade em estado puro, primordial e visceral, aqueles instintos que ainda nos restam do tempo dos tigres de dente de sabre. É este Cronenberg que idolatro!
Cronenberg, esse icon bizarro do cinema pós-moderno! Ao lado de Lynch, Takashi Miike ou mesmo Darren Aronofsky, sempre foi inovando ao mesmo tempo que manteve o estilo. Os seus filmes aparentemente diferentes uns dos outros incorporam temáticas e elementos que lhe dão o carimbo (vermelho) de Cronenberg. O sexo bizarro, a violência e carnificina, a carne humana e a sua metamorfose, o desejo tresloucado. Todas estas coisas são as delicias dos amantes do seu cinema, onde me incluo, não fazendo disso um facto muito público.
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