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A semana passada dei boleia ao Álvaro da contabilidade. A viagem era curta, mas o infeliz acontecimento de um camião se ter despistado no meio da ponte que preciso de atravessar para chegar a casa, quando me encontrava já num ponto de não retorno, obrigou-me a enveredar pela eventualidade mais horrenda com que um ser humano se pode deparar: a conversa de circunstância. Olhei pela janela do meu lado enquanto o Álvaro olhava pela janela dele com sintomas de um ataque de pânico. Eu abomino a maior parte do contacto social, mas o Álvaro é de outra divisão. É um tipo que tem ataques de pânico frequentes por ansiedade social. Perguntei-lhe se gostava de cinema. Olhou para mim todo sorridente, suado e com aspecto ligeiramente paliativo e disse-me que sim. Disse que ia ver o Super-Homem porque era um filme espectacular. Eu perguntei-lhe porque raio acharia ele espectacular um filme que ainda não tinha visto? “Às tantas vais ver e depois é uma desilusão, Álvaro. Isto de uma pessoa criar expectativas é mau para tudo na vida, desde o sexo ao cinema.” Disse eu tentando legar alguma sapiência ao frágil Álvaro.  Bom, deviam ver como o rapaz ficou. Começou a hiperventilar e só não morri ali com o crânio esmagado porque o Álvaro é um franganito incapaz de carregar mais que uma resma de papel de cada vez. Olhou para mim com as labaredas do inferno inflamadas nas retinas e disse-me que era espectacular porque tinha visto o trailer, e que os efeitos especiais eram os mais caros de sempre, e que o Nolan também tinha realizado (sic) e até já tinha visto online umas críticas e diziam que era o melhor filme de super-heróis de sempre. Para quebrar o gelo ainda lhe perguntei o que ele achava do facto de lhe terem tirado as cuecas vermelhas do lado de  fora e o terem obrigado a manter a sua roupa interior no seu devido lugar. Não me respondeu. Pegou no telemóvel e começou a jogar Snake II.

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