Está agora a fazer um ano que empacotei os meus filhos e a minha esposa para casa dos meus sogros e fiquei sozinho durante uma semana. Vi-me num vazio rotineiro que tentei apressadamente preencher. Pegar na bicicleta e ir fazer aqueles passeios que tenho pendentes há anos, ir de mota à Figueira da Foz jantar com os amigos, começar finalmente a fazer jogging, fazer um barco com fósforos, resolver problemas eléctricos na garagem, alterar a combustível do condensador de fluxo (plutónio está caro) ou começar a escrever o tal livro… Depois de muito ponderar optei pela mais lógica: ficar deitado semi nú no sofá a ver filmes, com a migalhas na barriga e as mãos cheias de gordura de pizza, incapaz de colocar em pausa porque os comandos tinham entretanto desaparecido para o limbo dos comandos desaparecidos. Acordar todo torto na sala com o nascer do sol e uma poça de baba ao lado da almofada, sentir-me envergonhado por não aproveitar o tempo e deprimido demais para mudar de actividade. Inventar desculpas para a origem daquelas manchas de gordura no sofá. E com isto aproveitei para rever as sagas Dirty Harry e Death Wish. De seguida em formato maratona, coisa que nunca tinha feito. É esta experiência que aqui quero deixar, escolhendo para vós 3 de cada saga para que possam também organizar uma semana dedicada ao tema “Justiça à força de balázio”.
Comecemos pelo mais cru e violento dos dois franchises. Death Wish é uma saga de 5 filmes protagonizados por Charles Bronson que nos conta as tropelias de um pacífico arquitecto transformado num impiedoso”vigilante” pelas injustas improbabilidades do destino. Dos cinco tomos desta série dedicada à barbárie urbana ressalvo os primeiros três que são, curiosamente, aqueles realizados por Michael Winner.
Para apreciar correctamente esta saga é necessário que o cinéfilo se faça munir das versões originais não censuradas dos filmes. Não são fáceis de arranjar uma vez que as ultimas edições têm sido barbaramento retalhadas para apaziguar o facto de que ultimamente toda a gente se sente ofendida com tudo. Inclusivé com coisas que não eram ofensivas à altura do seu lançamento e que muita gente é incapaz de contextualizar porque lhes falta a capacidade intelectual necessária.
Death Wish (1973)
Um pai de família integro, arquitecto e cidadão cumpridor ausenta-se em trabalho. O melhor da sua área, atenção ao detalhe e perfeccionismo. Durante a visita de trabalho ao Texas oferecem-lhe uma arma. Como recuerdo da passagem pela capital do balázio. E ainda bem, como vamos à frente concluir. Na sua ausência a sua casa é invadida por meliantes que perseguem a esposa e a filha. Sádicos e violentos, este gang típico da Nova Iorque dos anos 70 tem como particularidade um jovem desconhecido chamado Jeff Goldblum. Depois de amedrontar as senhoras e as confinar ao infímo espaço da sua sala de estar, procedem a violar lentamente e com requintes de sadismo. E no final matam-na. A filha sobrevive um bocado atordoada e em muito mau estado físico e emocional. Pudera, coitada! Ora, esta cena encontra-se barbaramente cortada nas edições recentes. Apesar de, para os standards actuais, esta cena ser um bocado exagerada, na altura servia o seu propósito. Sendo este um revenge movie, há que incitar no cinéfilo a vontade de vingança, queremos ver aqueles pulhas a sofrer, provar do seu próprio remédio.
E é isso que temos. Charles Bronson regressa, ajoelha-se de braços erguidos a dizer “Noooooo!”, vai ao funeral, visita a filha no hospital dos doidinhos porque entretanto ela ficou meio alucinada, e procede a pegar na arma do Texas e a enfardar balázio sortido em tudo o que lhe pareça remotamente ladroagem vagabunda. Mesmo que sejam guitarristas de blues ou os jovens de bem com a tez mais escurecida . E morto em morto, Bronson chega finalmente ao gang que lhe chacinou a esposa à força de varapau e procede com redobrado requinte à sua precoce extinção.
Um filme negro, violento e fortemente perturbador. Safa-se a filha, vá lá!
Death Wish II (1982)
Se o primeiro foi poderoso para as emoções, o segundo foi absolutamente devastador. A filha do Bronson, aquela que mencionei no parágrafo anterior como tendo sobrevivido, é raptada no início deste segundo volume. As partes que poderão estar cortadas nas edições recentes têm a ver com a longa cena de violação que se segue. Um a um, os malandrins vão violando, dançando, cantando, fumando e a rir maléficamente. O malandrim chefe é o Laurence Fishburne em fase inicial de carreira. Já maior de idade, ao contrário de Apocalypse Now. Bem, e como violar cansa, a filha do nosso herói aproveita uma pausa para fugir. Atira-se pela janela para conhecer fim pior que a barbárie do sexo não consentido: ficar empalada numa vedação bicuda a esguichar sangue e a estrebuchar um último tango.
Bronson volta a casa, dizem-lhe que a filha morreu, ajoelha-se a gritar “Nooooooo!”, pega em mais armas, mata mais malandrins, com o dobro da violência, encontra o gang com mais membros, mata-os com mais redobrados requintes de malvadez e nós adoramos cada pedaço. Adoramos mais ainda, a dobrar. A nossa costela de vingadores de facebook vê a materialização da vingança. Sob a égide de uma obra de ficção, é certo, ainda assim o nosso cérebro é enganado momentaneamente. Partindo do principio que não estão no smartphone ou a olhar para ontem.
Este é o filme mais censurado de todas as edições actuais porque o combo violação / empalada a estrebuchar não é popular. Apesar de servir como buildup para vingança e a redenção. Temos que ter em conta que se tratava da época dos exploitation movies e que as pessoas sabiam a diferença entre realidade, ficção e exploitation.
Death Wish 3
Death Wish 3 perde a numeração romana porque os americanos não perceberam o que eram aqueles dois is maiúsculos em frente ao titulo do anterior. E com isto atiraram a negridão e o urbano depressivo às urtigas e fizeram um sleaze fest à anos 80 com exagero quanto baste e todo um repertório de violência descabida e irreal, desde os gangs e cenários quase pós-apocalípticos ao uso de material de guerra e situações de envergonhar o estado islâmico sem que nenhuma força da autoridade se digne a aparecer para ajudar.
Ora Bronson já não tem família, tudo morto e violado, e volta para ver uns amigos. Azar do caralho começam a ser importunados por um gang, estes:
Liderados por este:
Bom depois é batalha campal até ao fim, onde vale tudo mesmo arrancar olhos. E arrancam-se alguns. Uma mistura de Policia Academia com o Rambo em ambiente urbano, Death Wish 3 é uma das mais excepcionais extravagancias dos anos 80. Até digitalizei um trailer de uma velha cassete VHS para que possam apreciar. Se tiverem que ver um destes filmes sob o efeito de canabinóides”,, escolham este.
A SIC do início dos anos 90 a amaciar o trailer de Death Wish 3.
Posted by Pedro De Alarcão Lombarda on Quarta-feira, 1 de Outubro de 2014
Depois disto vieram o 4 e 5 que não sendo maus também acrescentam muito ao universo. Bronson começava a ficar velho demais e acabou. Pouco tempo depois morreu deixando-nos um majestoso legado do qual estes filmes não fazem parte do top 10 sequer.
Voltarei mais tarde com Dirty Harry. Bons sonhos criançada, deixo-vos com multimédia sortida que tirei das minhas fotos do Facebook.
Death Wish 4: The Crackdown. Se não lhe matassem e violassem a família e os amigos todos no inicio de cada filme, isto não teria que acontecer.
Death Wish 5: The Face of Death (1994). A razão pela qual não se deve entrar num confronto de cabeça quente.
Adenda:
Cenas cortadas nalgumas edições em DVD e Bluray do 1:
http://www.cutscenes.net/videos/505/death-wish-kathleen-tolan-1974-dvd-quality-mom-and-daughter/
Cenas cortadas nalgumas edições em DVD e Bluray do 2:
http://www.cutscenes.net/videos/506/death-wish-ii-silvana-gallardo-1982-dvd-quality-horrable-group-rape-video/
Cenas cortadas nalgumas edições em DVD e Bluray do 3:
http://www.cutscenes.net/videos/507/death-wish-iii-marina-sirtis-1985-dvd-quality-rape/
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