Produtora Blumhouse, 9 horas da manhã, segunda feira
O Jason Blum, proprietário da produtora, passeia-se numa trajetória oval em frente a uma comprida mesa de reuniões. Mãos atrás das costas, inclinado para a frente, expressão de profunda preocupação. Ao longo da mesa, na ponta oposta, estão algumas pessoas responsáveis pelo filme Ma. O silêncio aterrador é entrecortado por passos pesados e secos do Sr. Blum que, de repente, se detém. Respira fundo, mete uma mão na testa como a segurar a cabeça e vira-se de modo teatral para a mesa. Um movimento lento e predador. Ao fundo ouve-se um “gulp!” mas Blum não percebe quem foi. Teria que acelerar o movimento e rodar os olhos, algo que não faria como profissional do drama. Mãos na mesa, acompanhadas por um bater que ecoa pela sala. Levanta os olhos, fixa a pessoa imediatamente ao fundo, na ponta da mesa. A tensão prestes a ser quebrada não alivia ninguém.
– Scotty – aponta para o argumentista – esta história de background que serve de motivação à vilã… Isto foi tirado de alguma revista sentimental para miúdas de 14 anos?
– Eu…. – gagueja o débil Scotty procurando justificar o injustificável.
– Cala-te, meu merdas! – grita Sr. Blum – Estás aqui para ouvir. Não é para falar. Quero essa puta dessa narrativa alterada. As pessoas precisam de se sentir identificadas. Para esta merda vão ao sótão da avó buscar algumas revistas Maria de 1987 que os ratos ainda não roeram.
Faz-se sentir um silêncio fúnebre e alguém tosse. Ouve-se respiração ofegante de alguém.
– TATE! – Grita novamente o Sr. Blum dirigindo-se ao realizador – Tate, tate!… Se não fosse eu, deixavas esta pouca vergonha ir mesmo assim. Argumento parvo, sem motivações, personagens vazios e irrealistas. Parvoíce saída do Disney Channel. Só faltava dobrarem em espanhol e meterem gargalhadas. Era igual.
Tate engole em seco e não consegue falar. Olha para o chão, olhos húmidos.
– Um filme que só pode ser verdadeiramente apreciado por drogados que adoram tudo, mas mal o filme acaba já se esqueceram. Isto, meus amigos, parece-vos um nicho aceitável? Eu sei que é o vosso nicho, mas caramba… E as donas de casa que deixam os filhos na escola para ir beber vodka às nove e meia da manhã? E todos aqueles funcionários públicos que conseguem ver filmes no trabalho com headphones? E os estudantes ressacados que aproveitam as 7 horas de Expresso da Rodoviária para ver filmes?
– Sr. Blum, o probl…. – um dos produtores tenta falar
– O problema é que tu és outro borra-piças. – retorquiu o Sr. Blum – Aceitar todos estes buracos de lógica, saltos narrativos e decisões parvas do argumento. Tu, meu bandalho, podes já começar a mandar currículos antes de sair desta sala.
– O FILME JÁ ESTREOU A SEMANA PASSADA…. – Grita Greta, a anotadora com a sua caneta.
– Oi? Perdão? – Sr. Blum responde confuso
– Sim, hoje era só para falar da versão para homevideo e streaming.
– Sendo assim… – responde Sr. Blum enquanto se compõe – metam lá aquela cena apagada da gaja atropelar a gaja do jogging e umas cenas de pinocada.
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